Você clicou numa animação feita no Winplot que demonstra as diferentes configurações do campo elétrico produzido por três cargas elétricas, para diferentes distâncias entre as cargas. Esta é uma das muitas aplicações efetivas do computador ao ensino. Mostrarei abaixo um resumo dos fatos e passos envolvidos na preparação de cenas como essas no caso de um dipolo elétrico "horizontal".
O potencial elétrico num ponto , devido a uma carga pontual
, é um número real (escalar) que varia apenas com a distância
de
à carga, sendo dado por
,
onde é uma constante que depende do sistema de unidades adotado. No sistema MKS, por exemplo,
. Entretanto, para simplificar o nosso trabalho no Winplot, suporemos que
. (Isto corresponde a adotar o sistema CGS, cuja unidade de carga é o statcoloumb.) Simplificaremos mais ainda os cálculos se trabalharmos com cargas unitárias (
) situadas num dos eixos coordenados. Assim, para uma carga unitária na posição
, o potencial num ponto
será
,
onde ou
conforme o sinal da carga.
O potencial elétrico devido a um conjunto finito ("distribuição discreta") de cargas é simplesmente a soma dos potenciais. No caso de um dipolo elétrico, temos exatamente duas partículas de mesma carga e sinais contrários. Portanto, o potencial num ponto devido a um dipolo com cargas unitárias nas posições
e
,
, será
.
Observe que, por puro acaso, colocamos a carga negativa em . No Winplot, a letra "
" será usada como constante dinâmica: variando-a com o mouse, poderemos aumentar ou diminuir a distância entre as cargas e observar a configuração do campo. Mas, de onde virá o campo?
Diferentemente do potencial, o campo elétrico é um vetor, que se relaciona com o potencial de uma maneira bem simples: , onde
indica o gradiente. Ou seja, as componentes do campo elétrico produzido pelo dipolo num ponto
são obtidas calculando-se as seguintes derivadas parciais (uma aplicação fácil da Regra da Cadeia):
É aqui que o computador entra em cena. Obtivemos um sistema de duas equações diferenciais, e o Winplot possui recursos para exibir graficamente as soluções de tais sistemas, bem como o campo vetorial correspondente. No nosso caso, as soluções são as linhas de força do campo elétrico e os vetores tangentes a essas curvas constituem o próprio campo!
Nas versões mais recentes do Winplot, a expressão pode ser escrita como abs(x,y). Verifique que
pode ser escrita como
(x - a)/abs(x - a, y)^3 - (x + a)/abs(x + a, y)^3
Obtenha uma expressão ASCII semelhante para a segunda componente do campo.Após entrarmos com as equações do campo no Winplot, podemos identificar os sinais das cargas olhando apenas o gráfico: basta lembrar que o campo produzido por uma carga positiva (negativa) é de afastamento (aproximação). O gráfico feito com o Winplot mostra claramente os vetores "saindo" da carga positiva e "indo" para a carga negativa.
Repare-se que não usamos propriamente o potencial, e sim as suas derivadas parciais, a partir das quais obtivemos o campo. Entretanto, podemos utilizar a expressão do potencial para plotar as linhas eqüipotenciais do dipolo (que não devem ser confundidas com as linhas de força do campo mostradas acima). Isto se consegue facilmente no Winplot: basta entrar com a equação e construir uma família de curvas no parâmetro c. Na animação abaixo, as linhas equipotenciais foram obtidas escolhendo-se 14 valores de c tais que
.
Utilize o Winplot para estudar configurações de campos elétricos (a) produzidos por mais de duas cargas unitárias; (b) produzidos por várias cargas com diferentes valores e sinais.
O que vimos acima foram ilustrações puramente bidimensionais de campos elétricos. Na realidade, porém, as cargas situam-se no espaço tridimensional. As linhas eqüipotenciais aqui mostradas são interseções de superfícies eqüipotenciais com o plano das cargas. Planeje um cenário para a exibição de cargas e linhas de força no espaço, como na figura abaixo (também produzida com o Winplot).
Um comentário final. Embora a simulação deste experimento no Winplot (ou em qualquer software estritamente matemático) exija conhecimentos razoavelmente avançados de Física e Matemática — tais como a determinação do campo a partir do potencial —, isto certamente não impede que o professor pré-universitário apresente tais gráficos em sala. Mais ainda, os alunos podem interagir com os gráficos sem que saibam o que realmente ocorre por trás dos bastidores (as equações diferenciais, etc.). Afinal, ninguém deixa de usar um processador de textos por desconhecer os algoritmos que controlam a justificação automática dos parágrafos.
Carlos César de Araújo, 12 de janeiro de 2003